sexta-feira, 28 de maio de 2010

No país das maravilhas

É a segunda vez que isso acontece: "você é tão bonita, devia sair mais. Conhecer gente, arranjar um namorado. Não pode ficar sozinha", diz o motorista gentil que às 2 da manhã, após um dia todo de trabalho, puxando papo me aconselha a viver a vida.
Posso até ter mentido, mas estou bem assim. Estou focada no trabalho, tenho outros objetivos neste momento. Devo aproveitar enquanto tenho saúde e posso me matar de trabalhar para conquistar minha independência financeira. Depois penso em passeios, viagens, namorados.
Consegui acalmar meu coração e coloquei dentro dele outras prioridades. Não desisti. Apenas estou adiando, mesmo porque me envolver com alguém que não está interessado realmente num relacionamento (não estou falando em casamento!) não está nos meus planos agora, depois de tudo que passei.
E claro que penso, quando coloco a cabeça no travesseiro, como seria bom ter alguém para compartilhar comigo tudo o que está acontecendo agora... Mas também não quero um cara que fique controlando tudo o que faço, alguém que eu tenha que ficar comunicando pra onde vou o que farei.
Acho que estou bem...ou pelo menos sei fingir muito bem. Só me sinto como se estivesse num mundo paralelo, não tãaaaao maravilhoso assim.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

O quintal

Abril ficou pra trás. Maio já está no fim. Estou vivendo o início de junho. Tudo acontecerá em junho.
E são de junho as minhas memórias mais queridas. Junho lembra quentão, pinhão, bolinho de frango e fogueira. Comemorávamos assim os aniversários de minha avó, na chácara, no interior de São Paulo. Tive uma infância maravilhosa, devido o trabalho de minha mãe, fomos - minhas irmãs e eu - morar com meus avós na chácara. Lá, as árvores frutíferas eram nossos esconderijos e refúgios. O quintal era imenso e cada dia era dia de novas experiências e de explorá-lo na companhia das minhas irmãs e primos. As árvores, apesar de plantadas, pareciam estar ali há séculos. Com exceção de um flamboyant gigante na entrada da chácara que dava as boas vindas às visitas e que, quando vendida a área, foi a primeira coisa a cair ao chão. Naquele dia, chorei como um bebê ao ouvir o som da serra elétrica. Foi como se podassem pedaços da minha infância.
Também tinha goiabeiras, abacateiros, laranjeiras (de todos os tipos), pés de cana de açúcar, limoeiros, jabuticabeiras, amoreiras, caquizeiros, pés de romãs, peras, maracujá e mangas, pitangueiras, pés de jacas. Flores de todos os tipos e cores. Quatro pés de ipês brancos foram plantados paralelamente à varanda da casa e quando floresciam, iluminavam o jardim.
Lembro-me da varanda, comprida, com vários bancos e cadeiras e lá no fundo, uma rede ao lado da lousa onde deixávamos recados todos os dias. No meio, quase em frente à porta principal, a cadeira de balanço do meu avô. E ele, lá sentado, ouvindo seu rádio de pilha laranja.
A porta dava para a sala. Do lado direito, a poltrona da minha avó e um banquinho de couro vermelho, apoio para os pés. À frente, a estante com a TV. À esquerda o sofá e à frente, uma rádio vitrola muito antiga, que sumiu de casa após a morte da vovó. À esquerda da sala, ficava o quarto da vovó, que tinha um cheirinho de cânfora. À frente da sala, a copa, enoooorme, com duas mesas, uma cristaleira muito antiga que também sumiu e o relógio cuco que tinha pelo menos uns 200 anos. Adivinhem? Sumiu! Dizem que foi vendido. Ao lado da copa, o quarto do vovô, disposto perto do banheiro. E a cozinha ao lado da copa. Cozinha antiga, com cortinas e panos de prato de um xadrez azul que nunca esquecerei. A porta da cozinha dava para o quintal.
Ah, o quintal. Era lá também o nosso universo. De um lado o viveiro de aves do tio. Cheio, repleto de passarinhos coloridos. Do outro, o galinheiro. Isso mesmo, a chácara tinha um galinheiro, misto de horta. Minha avó plantava todas as ervas aromáticas que usava na cozinha. E do lado da horta, o galinheiro. Pavões, patos, marrecos, faisões, galinhas, codornas eram criados. Nós colhíamos os ovos, quentinhos, saídos do forno! E tínhamos um pouco de remorso quando comíamos a omelete. Matar uma galinha para o almoço de domingo era a morte pra gente. Literalmente!
E para completar, nosso tio tinha vários cães. E para disputar espaço, os gatos da minha tia solteira. Tudo isso num lugar que para crianças, era mágico. Lá, o maior crime do mundo podia ser praticado a qualquer hora: roubar aquela fruta fresquinha e comê-la aos pés da árvore, sem vizinho reclamando.
Minha infância tem gosto de cana de açúcar cortada em quadradinhos, de chá de romã para curar dor de garganta, de laranja lima bem docinha, de bolinho de chuva em dia frio. Tem as memórias de brigas e aventuras entre primos. De alimentar as aves do galinheiro toda tarde. De colher amoras para fazer geléia. Da esperança de salvar os passarinhos caídos dos ninhos.
Quando saí de lá, o meu quintal era a lavanderia do meu apartamento em Sorocaba. E por algum motivo, sinto falta dele também. Lá, os amigos se reuniam para fumar, além de ser assunto quando a colega de quarto deixava o lixo criar chorume...
E como disse, em junho, as coisas acontecerão. Quem sabe até lá, já terei o MEU quintal...