domingo, 14 de dezembro de 2008

Diário de Patrícia - parte 10 - Freak and Maniac

Os dias passaram e nem percebi que já estamos em Dezembro.
O fim do ano demorou chegar. Se arrastou. Pelo menos para mim.
Os últimos seis meses foram tão loucos que quando estava no meio do furacão, juro, parecia que nunca ia passar. Mas passou. E agora noto que foi rápido demais.
Eu, que antes adorava o fim do ano, há 10 anos luto para poder me sentir bem nessa época. Apesar de saber que é um período de resoluções, de renovação, não tenho feito nada e nem tenho tido esperanças. Para falar a verdade, o tiro tem saído pela culatra. Em todos os sentidos.
Acho que vou aproveitar a época e me esconder, ou melhor, hibernar para ver se consigo guardar um pouco de energia para o ano que vem.
Ah, Natal, adoro o cheiro dessa época. De nozes, avelãs, castanhas portuguesas. De panetone. De vinho branco.
Entretanto, tantas coisas aconteceram nessa época do ano que comecei a fugir de festas natalinas. Mas essa não é a razão principal. Realmente não tem mais graça comemorar o Natal sem meu pai. Sem saber, minha mãe, minhas irmãs e eu fazíamos essas festas por causa dele. Ele adorava reunir a família toda em casa. Até hoje lembro os natais que passamos. Todas as minhas tias, tios e primos ficavam em casa. E era aquela festa. Meu pai adorava a casa cheia, mesmo que de mulheres em sua maioria! O legal não era a troca de presentes e sim, a convivência com minha família. Era gostoso passar horas conversando na cozinha.
E isso eu não tenho mais.... Simplesmente não tenho vontade de voltar pra casa para comemorar o Natal. Não sei definir se é o retorno ou se é a época. Acredito que a época. É triste...
Anyway. Não estou nem um pouco empolgada. Bom, talvez um pouco pois terei uns dias de folga e, sinceramente, estou precisando relaxar. Uns dias na praia cairiam bem agora!
Uma das minhas lembranças de Natal feliz, vem do Canadá... Em 2001, resolvi passar sozinha, já que Daniel e Michelle, por insistência minha, foram à casa de uma amiga. Fiquei em casa tomando conta do Jordan (que na época tinha quase dois anos). E não é que, para minha surpresa, a campainha tocou às 23:45. E o Pedro estava lá, parado embaixo do visco esperando a porta ser aberta. Reza a tradição moderna, cristã, que se duas pessoas se encontram ao mesmo tempo debaixo de uma rama de visco, devem trocar um beijo. Daí você já deve ter imaginado o que aconteceu. Mas ficou por isso mesmo, juro. Nunca mais vi o Pedro. Ele terminou a faculdade seis meses antes de mim e voltou para Portugal. Seis meses depois eu voltei para o Brasil. Restou apenas a memória de um beijo como aqueles que a gente vê em filmes de Natal.
Enfim, além dessa, tenho boas lembranças de Natal. Acho que estou um pouco machucada com os recentes acontecimentos em minha vida. Me sinto como um anjo com uma asa quebrada: com um pouquinho de esperança de poder voar novamente, porém, com aquele medo que nos impede de tentar...
Mas. como sempre há um pinguinho de esperança, beeeeeeeeeem lá no fundo da minha alma, ainda acredito que meu desejo se torne realidade. Assim como fez Drummond. Mas ao contrário dele, o meu desejo é bem mais simples de ser realizado....


Organiza o Natal
Carlos Drummond de Andrade

Alguém observou que cada vez mais o ano se compõe de 10 meses; imperfeitamente embora, o resto é Natal. É possível que, com o tempo, essa divisão se inverta: 10 meses de Natal e 2 meses de ano vulgarmente dito. E não parece absurdo imaginar que, pelo desenvolvimento da linha, e pela melhoria do homem, o ano inteiro se converta em Natal, abolindo-se a era civil, com suas obrigações enfadonhas ou malignas. Será bom.
Então nos amaremos e nos desejaremos felicidades ininterruptamente, de manhã à noite, de uma rua a outra, de continente a continente, de cortina de ferro à cortina de nylon — sem cortinas. Governo e oposição, neutros, super e subdesenvolvidos, marcianos, bichos, plantas entrarão em regime de fraternidade. Os objetos se impregnarão de espírito natalino, e veremos o desenho animado, reino da crueldade, transposto para o reino do amor: a máquina de lavar roupa abraçada ao flamboyant, núpcias da flauta e do ovo, a betoneira com o sagüi ou com o vestido de baile. E o supra-realismo, justificado espiritualmente, será uma chave para o mundo.
Completado o ciclo histórico, os bens serão repartidos por si mesmos entre nossos irmãos, isto é, com todos os viventes e elementos da terra, água, ar e alma. Não haverá mais cartas de cobrança, de descompostura nem de suicídio. O correio só transportará correspondência gentil, de preferência postais de Chagall, em que noivos e burrinhos circulam na atmosfera, pastando flores; toda pintura, inclusive o borrão, estará a serviço do entendimento afetuoso. A crítica de arte se dissolverá jovialmente, a menos que prefira tomar a forma de um sininho cristalino, a badalar sem erudição nem pretensão, celebrando o Advento.
A poesia escrita se identificará com o perfume das moitas antes do amanhecer, despojando-se do uso do som. Para que livros? perguntará um anjo e, sorrindo, mostrará a terra impressa com as tintas do sol e das galáxias, aberta à maneira de um livro.
A música permanecerá a mesma, tal qual Palestrina e Mozart a deixaram; equívocos e divertimentos musicais serão arquivados, sem humilhação para ninguém.
Com economia para os povos desaparecerão suavemente classes armadas e semi-armadas, repartições arrecadadoras, polícia e fiscais de toda espécie. Uma palavra será descoberta no dicionário: paz.
O trabalho deixará de ser imposição para constituir o sentido natural da vida, sob a jurisdição desses incansáveis trabalhadores, que são os lírios do campo. Salário de cada um: a alegria que tiver merecido. Nem juntas de conciliação nem tribunais de justiça, pois tudo estará conciliado na ordem do amor.Todo mundo se rirá do dinheiro e das arcas que o guardavam, e que passarão a depósito de doces, para visitas. Haverá dois jardins para cada habitante, um exterior, outro interior, comunicando-se por um atalho invisível.
A morte não será procurada nem esquivada, e o homem compreenderá a existência da noite, como já compreendera a da manhã.
O mundo será administrado exclusivamente pelas crianças, e elas farão o que bem entenderem das restantes instituições caducas, a Universidade inclusive.
E será Natal para sempre.
(Texto extraído do livro "Cadeira de Balanço", Livraria José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1972, pág. 52.)
P.S.: me beija sob o visco..

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